Independência em três movimentos: antitráfico e o Brasil escravista no direito internacional

Adriane Sanctis de Brito

Resumo


Este artigo discute como a abolição do tráfico de escravizados esteve presente na construção da independência brasileira e como o direito internacional permeou esse processo em três movimentos. Primeiro, a adoção do tratado antitráfico foi condição para o reconhecimento do Brasil como novo Estado independente. Isso colocou o Brasil escravista em uma encruzilhada, pois sua elite política defendia a manutenção da escravidão, enquanto o país precisava seguir os passos "civilizatórios" da abolição para ganhar personalidade jurídica como um estado independente. Segundo, já sob o tratado ratificado, representantes brasileiros passam a se engajar em argumentação jurídica em prol dos interesses econômicos dos proprietários de navios apreendidos e da resistência à interferência britânica em sua soberania. Assim, agem para resistir às medidas antitráfico e manter a perversa prática escravista. Ao mesmo tempo, buscavam uma noção de autonomia e independência, agora não mais de Portugal, mas da Grã-Bretanha. O terceiro movimento conta o fim do tratado e a reinvenção da história: brasileiros e britânicos chegam à leitura de que havia acabado a vigência dos dispositivos do tratado que garantiam direitos de visita, apreensão e adjudicação. O recrudescimento das relações com a Grã-Bretanha faz surgir uma narrativa de ressentimento e superação que busca uma nova independência.

Palavras-chave


independência brasileira, abolição do tráfico de escravizados; Grã-Bretanha; direito de presas; tratados internacionais

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DOI: https://doi.org/10.5102/rdi.v20i1.9072

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